segunda-feira, 11 de julho de 2011

Cafezais 9

Rubens

O mistério da terra. Fugaz como os cometas que cortam os céus campestres em noites desprovidas de luares. Concebido para o café, não vingou a determinação do destino. Rebelião a cada dia. Entendeu o mundo pelo avesso e desafiou a ordem de todas as coisas. Fez o croqui de uma liberdade sem ideologia que só nasce em sonhos projetados nos ventres dos cafezais, silenciosamente, enquanto mãos convulsas vão ceifando as ervas daninhas que insistem, dia após dia, em devorar cada árvore de café, progenitoras de tantas mágoas. Embriagou-se pelo perfume, não os das floradas primaveris, mas aquele perfume que inebria e acende o prazer da vida e perpetua a espécie. Encantador de palavras, de letras, de imagens de gibis. Traçou seu mapa de tempo e de vida.  Veio em uma manhã de natal, enchendo de festa outra festa. Aos quatorze fez-se paixão, aos dezesseis perpetuou sua imagem, beijou-a. Aos dezenove projetou outra imagem, não teve tempo para beijá-la. E numa manhã de uma semana santa, numa imitação muito aquém das coisas divinas, misteriosamente partiu, levando com ele uma vida inteira que podia ter tido e não teve. Deixou em mim a lembrança difusa de um tapa, de uma moringa quebrada, do desespero de uma mãe, de um choro convulso de pai.  Deixou também a primeira experiência de uma partida sem sentido, uma tristeza coletiva, uma verdade inacabada. Um projeto de liberdade sobre a estante em forma de fotografia em preto e branco. Rubens, meu irmão, volta para acabar de contar sua história. Uma história que se prolonga em nós e se dilui como gotas de chuva que vão se incorporando a terra e alimentando os cafezais.

MAReis

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